sábado, 18 de outubro de 2014

Relatório - A questão de Olivença

            No dia 10 de Outubro de 2014, realizou-se um debate sobre a questão de Olivença no âmbito da disciplina de Direito Internacional Público, que tem oposto Portugal a Espanha relativamente à soberania do território em questão há pelo menos 2 séculos. Maria Estela Lopes e Sofia Ferreira defenderam a posição de Portugal e Joana Rola e Sofia Teixeira a posição espanhola.
O Professor Francisco Pereira Coutinho fez uma nota introdutória em que explicou que este seria um debate ligeiramente diferente dos realizados anteriormente, pois as equipas somente iriam apresentar o seu ponto de vista, e não iriam trocar ideias e argumentos entre si. Também salientou o porquê de se realizar este debate: a questão de Olivença é uma questão actual, e, apesar de não ser muito falada, divide Portugal e Espanha. Nesta região não há fronteira definida e as questões de fronteira são relevantes; são uma fonte de tensão entre Estados, e têm consequências não só jurídicas, como políticas, históricas, económicas e socioculturais.
Procedeu-se então à apresentação por parte da equipa que representava Portugal, seguida pela equipa que representava Espanha.
Maria Estela Lopes começou por apresentar o seu grupo, e, visto ser a primeira equipa a falar, antes de exporem os seus argumentos a favor de Portugal, fizeram um enquadramento histórico da questão, para que todos os presentes a pudessem compreender na sua íntegra. Localizaram o território geograficamente, na margem esquerda do Guadiana, e explicaram como originou Olivença no séc. XIII, ligada à Reconquista Cristã, e como desde então pertenceu a Portugal, facto reconhecido formalmente com o Tratado de Alcanizes, em 1297, celebrado entre D. Dinis e Fernando IV de Castela. Este tratado delimitou as fronteiras entre os dois Estados, atribuindo Olivença a Portugal. A posse do território mudou no séc. XVIII, após a chamada Guerra das Laranjas – Inglaterra e França estavam em conflito, e estando Espanha aliada a França, Portugal sentiu-se pressionado a juntar-se a estes, algo que se recusou a fazer devido às suas relações com Inglaterra; tal resultou na invasão, em 1801, de Portugal, tendo sido Olivença uma das terras ocupadas. Assinou-se, então, em Junho do mesmo ano, o Tratado de Badajoz, que estabeleceu a paz entre Portugal e Espanha, e através do qual Portugal cedeu a esta Olivença (artigo 3º do tratado).
As colegas que representaram Portugal de seguida explicaram as razões pelas quais este tratado veio a perder toda a sua validade nos anos seguintes, provando, dessa forma, a legitimidade do direito a Olivença por parte de Portugal e o dever de Espanha a devolver.
Começando com uma perspectiva jurídica, mencionaram que a nível interno a Constituição da República Portuguesa no seu artigo 5º estabelece que Portugal abrange o “território historicamente definido”, o que remete para o Tratado de Alcanizes, o único que definiu até agora as fronteiras na região de Olivença, e, portanto, o que se aplica. A nível internacional, esta questão enquadra-se na matéria das formas de aquisição de território: existem duas formas diferentes de aquisição de território, a conquista/cessão contratual e a prescrição aquisitiva/usucapião, e o grupo argumentou que nenhuma delas se verificou. A conquista/cessão contratual por parte de Espanha de Olivença não se verificou, pois foi restituída a soberania de Olivença a Portugal porque o Tratado de Badajoz é considerado inválido: Espanha violou o tratado ao assinar o Tratado de Fontainebleau com França (que levou às invasões francesas em Portugal); também D. João VI declarou unilateralmente no seu Manifesto o tratado como nulo; depois do afastamento de Napoleão do poder, Portugal e França celebraram um tratado de paz, considerando o Tratado de Badajoz como nulo; e, em 1815, com o Acto Final do Congresso de Viena retira-se qualquer força jurídica ao tratado, consagrando-se como ilegítima a apropriação de Olivença por Espanha e assumindo esta o compromisso de a devolver, ao assiná-lo em 1817 – algo que até agora não foi feito, como foi salientado.
No entanto, não havendo dúvidas quanto à transferência efectiva de Olivença para a soberania portuguesa, a verdade é que Espanha tem mantido uma ocupação de facto do território, pelo que se poderia considerar a aquisição deste por usucapião. Segundo o grupo, tal não aconteceu, porque os requisitos necessários para se verificar a aquisição de um direito real sobre um território por usucapião não se reuniram: não é claro como a Espanha possa ter exercido de forma ininterrupta a sua autoridade, a posse de Olivença tem sido feita de modo pacífico apenas porque Portugal tem feito esforços no sentido de não por em causa as boas relações diplomáticas existentes, e, para além disso, Portugal nunca reconheceu, de forma expressa ou implícita, a soberania espanhola sobre o território.
Aliado a estes argumentos de natureza jurídica, destacaram ainda as características arquitectónicas de Olivença, que demonstram uma cidade tipicamente portuguesa, e que apesar da modificação forçada por parte de Espanha da sua cultura, persistem inúmeros vestígios da cultura portuguesa, ao nível da língua, música e gastronomia. Para ainda reforçar esta posição de Portugal como titular do direito a Olivença e de como Espanha deveria devolver o território, fez-se uma comparação com a situação de Gibraltar.
De seguida deu-se lugar à exposição do caso por parte do grupo que defendeu a perspectiva espanhola. Joana Rola começou por apresentar o seu grupo e depois iniciaram a exposição dos seus argumentos, questionando se o próprio Estado português reconheceria OlivenZa (tal como ao longo da apresentação se foram referindo ao território) como sua, ao mostrar 3 mapas diferentes, um deles do próprio Instituto Português do Mar e da Atmosfera, onde a fronteira de Portugal estava claramente demarcada, e Olivença não fazia parte do território português.
De seguida o grupo procedeu a analisar na sua perspectiva o que aconteceu, relembrando que depois da Guerra das Laranjas, celebrou-se o Tratado de Badajoz, em que Portugal cede Olivença a Espanha no seu artigo 3º, mas que este tinha outros objectivos, como o encerramento dos portos portugueses às embarcações inglesas, (artigo 2º) - o grupo então argumentou que o tratado era, de facto, válido, e que a sua alegada nulidade era absurda, devendo ser cumprido o princípio pacta sund servanda: Portugal assinou o tratado de livre vontade; apesar de este não ter sido ratificado pelo cônsul francês, tal não põe em causa a transferência de soberania de Olivença para Espanha, pois a finalidade do tratado era a paz e o encerramento dos portos portugueses aos ingleses, pelo que a não ratificação põe em causa apenas isso, e não a pertença de Olivença a Espanha, que era uma cláusula especial; acrescentou-se ainda que o Tratado de Fontainebleau não punha em causa o de Badajoz, pois o primeiro era secreto. Relativamente ao Acto Final do Congresso de Viena, que reconheceu o direito português ao território de Olivença e que determina que o ajuste deve ser feito “o mais brevemente possível”, o grupo defendeu que a correcta interpretação deste artigo é a de que esta é uma promessa meramente simbólica, pois a obrigação contraída por Espanha é a de apenas criar meios o mais brevemente possível, algo que Espanha fez ao tentar várias vezes com negociações. Portanto, o grupo conclui que o Tratado de Badajoz está ainda em vigor e que consequentemente, Olivença pertence a Espanha, segundo o princípio do domínio por conquista ou cessão contratual. Relativamente à forma de aquisição de territórios por usucapião, o grupo argumentou que todos os pressupostos se verificavam, dando uma explicação mais pormenorizada relativamente ao pressuposto do consentimento de Portugal, ao dizer que Portugal deu o seu consentimento tácito, ou seja, através do comportamento do Estado português, Espanha deduz o seu consentimento.
Por fim, o grupo mencionou os costumes, que o processo de aculturação dado em Olivença é indiscutível, dando como exemplos as touradas, o brasão da cidade estar em espanhol, utilização quotidiana da língua espanhola e até um vídeo que demonstrava que os habitantes da cidade torciam por Espanha num jogo de futebol contra Portugal. Mencionaram ainda um livro, uma tese de um autor espanhol, que defendia a posição tomada pelo grupo.
Para conclusão do debate, o Professor procedeu a algumas considerações finais, agradecendo o esforço das colegas e afirmando que, em termos jurídicos é mais ou menos claro que Portugal tem razão, mas que é difícil de facto resolver a questão. Portugal não pode renunciar a Olivença, pois isso vai contra a sua Constituição, mas também não pode levar a questão ao tribunal, porque isso seria um grande golpe nas boas relações diplomáticas que mantém com Espanha – e mesmo que ganhasse, ficaria com “uma cidade portuguesa habitada por espanhóis”. Ouviu-se a opinião de alguns alunos, que até nunca tinham ouvido falar desta questão, e o Professor mostrou um vídeo humorístico da “tomada” de Olivença pelos portugueses. Concluiu-se que esta é uma questão actual, que não deve ser descurada, que tem perdurado no tempo e que não tem sinais de se resolver num futuro próximo.


Relatório elaborado por: Sara Ferreira nº 003527

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